A resiliência como um problema e uma ferramenta em lidar a saúde mental

Nos artigos desta semana, dois profissionais no campo da psicologia falam dos problemas de saúde mental que estão surgindo devido às questões atuais como covid-19. Parece-me que os dois artigos abordam o assunto de saúde mental de uma forma mais individual. Por exemplo, o primeiro artigo começa assim: “O antigo presidente da associação de psicologia de Moçambique apresenta dicas para enfrentar consequências psicológicas e mentais da COVID-19.” A frase “apresenta dicas” me faz pensar que o público deste artigo não é formado só pelos psicólogos, mas sim por todos. Da mesma maneira, no segundo artigo, Nuno Mendes Duarte está promovendo seu novo livro, Superar a Ansiedade. O fato de ser descrito como “um manual para conquistar uma vida calma” indica uma abordagem que se concentra em como o indivíduo vai enfrentar o estresse.

Isso me lembra de uma professora que eu tive que fez sua tese sobre o conceito de resiliência. Ela explorou como o surgimento da resiliência em tempos complexos/ “unprecedented times” muda quem tem a responsabilidade de cuidar da saúde mental. Ela disse que pensou nisso pela primeira vez quando viu um sinal que dizia “Pare de me chamar resiliente. Porque cada vez que você diz ‘Oh, eles são resilientes’, isso significa que você pode fazer outra coisa comigo.” A professora estava criticando o abuso do termo “resiliência” em situações muito difíceis; em vez de proporcionar apoio ou ajuda real, as pessoas em poder dizem que aqueles que estão sofrendo são resilientes e podem aguentar qualquer coisa. Acho que isso aconteceu muito no ano passado, especialmente com os trabalhadores dos serviços essenciais. Havia um tempo em que quase cada anúncio na televisão estava aplaudindo os enfermeiros, médicos e outros profissionais essenciais, mas não receberam nenhuma ajuda psicológica por todo o trauma que suportaram. 

Ainda acho que a resiliência pode ser uma ferramenta útil nos momentos difíceis na vida. Porém, também acho importante pensar em quais situações este conceito é usado e por quem é promovido. Na minha opinião, linguagem como “superar a ansiedade” coloca sobre o indivíduo a responsabilidade de lidar com problemas difíceis por conta própria, em vez de pensar na saúde mental como uma questão coletiva. O que significa se uma pessoa não pode “superar” ou “conquistar” um problema de saúde mental sem ajuda? Quer dizer que essa pessoa não é resiliente?

Algumas perguntas para a turma:

  1. O que vocês acham do conceito de resiliência? Até que ponto é justo/saudável depender de pura resiliência?
  2. Sei que hoje em dia o termo “self care” é muito comum quando falamos de saúde mental. Como vocês definem “self care”?
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4 Responses to A resiliência como um problema e uma ferramenta em lidar a saúde mental

  1. Vanessa Toro says:

    Para mim,”self care” significa reconhecer quando eu não estou me sentindo bem (mental ou fisicamente) e tirar tempo do meu dia para refletir sobre por que eu sinto-me assim, bem como fazer coisas para me ajudar a lidar. Eu acho que “auto-cuidado” não tem uma definição única, e que isso significa coisas diferentes para pessoas diferentes. Meu “auto-cuidado” pode envolver ações muito pequenas ou grandes. Eu costumava negligenciar o “self care”, mas durante a quarentena eu tinha mais tempo para me concentrar em mim mesmo. Algumas das minhas técnicas favoritas de “self care” incluem deitar-me na cama e ouvir música, limpar, pintar as unhas, ver filmes e ler. Espero continuar esta rotina de “self care” e que eu não perca de vista a minha saúde e felicidade ao passar pelos movimentos da vida.

  2. Lucas Wright says:

    Eu gosto do teu ponto de vista sobre a resiliência. Eu escrevi um pouco sobre este no meu reacção aos artigos, mas eu concordo com você. Ao dizer que uma pessoa tem “resiliência,” só é um marcador para “continuar assim.” E muitas vezes este sentido da resiliência não vem junto com um sentido de apreciação, só abuso no local de trabalho. Por isso, não acho que nenhuma pessoa deve sustentar-se com resiliência por si só, mas também com recurosos de saúde mental. Não é saudável tentar manter-se trabalhando com resiliência como motivo.

  3. Luis Pastore-Manzano says:

    Oi Raquel!
    Achei sua reflexão muito profunda como sempre. Durante a leitura de sua postagem, outro conceito de força de vontade própria veio à mente, especialmente quando falamos sobre parar de coisas como drogas. Na sociedade, sempre parecemos colocar a responsabilidade da luta sobre o indivíduo, deixando de reconhecer que essas questões vão além da individualidade.Aqueles que são capazes de superar suas lutas são, então, mais elogiados, deixando aqueles que continuam lutando se sentindo perdidos e fracos. Nunca percebemos como a mente é forte e como pode ser difícil superar o que ela deseja que você faça. Pensamos aprendendo algo que podemos entender. No entanto, nunca podemos compreender verdadeiramente toda a extensão da luta até que nós mesmos enfrentemos essas lutas. Resiliência não é uma questão de força e superioridade. Na verdade, a resiliência pode existir naqueles que dão os primeiros passos para superar um problema que parece inevitável. É sempre difícil e quem luta não deve ser dissociado de algo tão poderoso

  4. Elise Quesnel says:

    Olá Raquel,
    O teu comento foi muito interessante e gosto que estás a perguntar o que consideramos como o self-care por que este conceito é tão falado que torna-se algumas vezes difícil definir bem o que pode ser considerado curar-se de nós ! A minha visão do self-care mudou muito através os anos, mas foi sempre legada a uma forma de curar do meu corpo. Foi só recentemente que apercebi-me da importância da saúde mental e da maneira em que eu prendo tempo para a minha mente ! A coisa que realizei foi que estou sempre a pensar, todo dia, cada minuto, e não consegui relaxar-me ao nível mental por muito tempo.
    Agora a prática da meditação e da positividade (ou gratefulness ) ajudam-me a sentir me de acordo com o meu próprio corpo, e a minha mente. Por isso acho que self-care tem de incluir uma consideração mais geral de todo o que estamos e não só um lado físico o um lado mental.

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